O tempo passa,
o tempo voa e a onda machista continua existindo numa boa. É esse o pensamento
que vem quando observo o lugar da mulher contemporânea. Será que
seremos sempre escravas do "grande outro" que é a aprovação masuclina?
Pensando sobre
a mulher na atualidade que nos cerca e nos aperta, eu tenho um sentimento de
“nadar, nadar e morrer na praia”. Por
incrível que pareça, toda a luta, queima de sutiã e leituras sobre gênero não
parecem ter ajudado muito quando o assunto é interiorizar os nossos direitos e
desejos. O quadro que observo (o qual também faço parte) é que parece que as
mulheres ainda vivem o tempo todo sob a custódia do olhar masculino. É quase
que um jogo persecutório: “eu vou agir assim porque ser assim é mais aceito. Homem
não gosta quando a mulher faz isso.” Mesmo que não seja perceptível a tal
ponto, o que se apresenta à minha escuta cansada deste dilema é a mulher sempre
à mercê do opressor discurso pautado na supremacia masculina.
As minhas
queridas companheiras de gênero parecem não entender nada do que deve ser
aprendido. Relacionam-se esperando retornos dos homens, privam seus desejos, excluem
suas queixas, optam por escolhas que não fazem parte de suas ordens de desejo,
mas sim da ordem de desejo do outro, sendo que este outro as oprime e as
desqualifica em seus sistemas classificatórios para as mulheres.
Vamos para o
que interessa e sobre o que quero falar. Certa feita estava pesquisando algo
sobre gênero, buscando uma leitura interessante e eis que me deparo com um blog
de nome um tanto quanto duvidoso, algo como “manual do cafajeste”. O que me
pareceu assustador é que o tal manual era destinado ao público feminino. O
texto que abri estava falando algo como “o tempo certo para transar com o
cara”, comecei a ler, achei a temática interessante, visto que o assunto sempre
se mostra polêmico por ser relacionado à mulher, porque quando se trata do
homem não existe este debate todo. Li tudo e não acreditei. O tal homem chamado
de “cafa” dava mil orientações de como fazer o cara pensar que você é uma
mulher “direita” a partir do fato de levá-la para cama ou não, e então ele nos
classificou em três tipos. Vamos a tipologia:
1) Mulheres virgens (as mais
difíceis de levar para cama e as quais eles devem ter todo um “cuidadinho”
porque se apegam logo e depois é difícil de desgrudar. Palavras do “cafa man”);
2) As que gostam de “dar” sem
compromisso (dizendo ele que são mulheres que transam mesmo sem “compromisso
sério”, sem namoro. Para nosso querido essas só estão a fim de curtir por aí. Idéias
dele também.)
3) As que demoram muito para “dar”
ou que só “dão” namorando (dizendo o “cafa” que este é um grupo mais seleto,
onde até vale à pena arriscar a reputação “masculina solteira” para um namoro).
Ao ler isso
não me surpreendi, sendo que estava vindo de um homem assumidamente machista e
“cafajeste”, apesar de que me contorcia na cadeira quando lia as tais
classificações (mas já já falo disso). O surpreendente mesmo veio logo abaixo
nos comentários femininos. As mulheres “assinaram em baixo” essa bela
classificação, achavam que deveriam realmente agir assim para conquistarem um
cara. Fechei a janela do tal blog e mais uma vez refleti e pensei em escrever. No momento
não saiu nada sobre, estava elaborando tudo aquilo, mas acho que me permiti
falar (mais uma vez, estou cansando).
Desde quando a
mulher deve ser classificada como se fosse mercadoria de conquista, venda ou
troca? Somos coisas? Até quando vamos permitir que nos qualifiquem pelo nosso
desejo sexual, pela nossa vida sexual ou pelas nossas escolhas de quando vamos
transar? Por que vamos deixar que façam da nossa sexualidade motivo para sermos
“escolhidas”? Por que vamos permitir que os homens determinem o nosso
comportamento? Para que devemos nos boicotar de nós mesmas diante dos nossos
desejos? Por que aceitar que a opinião masculina/machista nos coloque em uma
classificação da ordem mais primária possível? Por que vamos continuar lendo
sobre nós coisas deste tipo e ainda as ovacionar e ficarmos caladinhas?
Estes são
alguns questionamentos que não buscam respostas. Estou falando de uma classe,
estou falando de ser MULHER. Nós não precisamos mais provar que somos muito,
que somos mais. Sabemos que existe todo o tipo de mulher e de pessoas, boas e ruins.
Mas quando o julgamento parte de um discurso do “opressor – oprimido” a coisa
muda de figura. Quando este discurso está pautado na diferença e supremacia de
uma classe perante outra, a coisa muda de figura mesmo. A mulher tem direito de
tudo que o homem tem também. Direito de trabalhar em grandes cargos, de
dirigir, de governar, de sair à noite, de beber, de transar, de gozar. A mulher
que se inaugura enquanto mulher banca todas essas coisas. A mulher que é mulher
no sentido amplo da palavra é múltipla, rala no seu trabalho, estuda, cria
filhos, perde noite, cuida da família. Nesta mesma mulher coexiste a que
deseja, a que quer sentir prazer e que pode e quer dar prazer também. Não é
necessário justificar nada, apenas falar que é abominável em pleno momento
pós-moderno que vivemos ainda existir este tipo de pensamento e a aprovação do
mesmo.
Vivam,
mulheres. Experimentem viver sem essas sufocantes amarras sociais que segregam.
A sociedade não precisa nos impor a forma que nós devemos ser. Se estiverem
buscando um relacionamento mais estável, o homem que estiver livre destas
amarras ridículas e pegajosas do machismo (eles existem e conheço muitos) vai
saber perceber que se você sente vontade de transar e transa é porque deseja, e
que desejo é movimento, é pulsação. Este homem vai saber que não é porque você
transa ou não transa que você é boa ou não para casar com ele e lhe dar filhos.
Não é isso que “qualificar” ninguém. O homem livre desses estereótipos percebe
a mulher de outra forma, o que vai conquistá-lo não é quando você fez sexo com
ele, mas sim coisas muito mais importantes para se estabelecer uma relação. A
história de vocês, a conversa entre vocês, a sua forma de ver o mundo, a sua
forma de lidar com as pessoas, a forma como o trata e como lhe dá carinho, a
sua visão de futuro, sua autonomia, sua independência, o companheirismo, a
compreensão, o olhar, o encontro. Enfim, não se apeguem a isso, não deixem o
discurso nebuloso machista se apropriar de vocês (de nós).
Eu repito e
vou morrer repetindo: tudo o que tiver de ser feito para que a mulher goze
plena de si mesma eu não medirei esforços para apoiar e para fazer. E conto com
a nossa tomada de consciência. Já demos grandes passos!
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